quinta-feira, 13 de agosto de 2009

O homicidio sem motivo qualifica-se por motivo futil ou torpe?

Selva!


Olá Meus caros,

Hoje ao estudar as qualificadoras dos crimes de homicídio fiquei pensando na possibilidade do homicídio não ter um motivo qualquer. Seria ele considerado um motivo banal, fútil?

Essa indagação ocorreu-me após a leitura da seguinte questão de Delegado de Policia Civil da Paraíba feita pelo CESPE em 2009 que em seguida iremos comentá-la:

QUESTÃO 34. Assinale a opção correta com relação ao crime de homicídio.

A) No homicídio qualificado pela paga ou promessa de recompensa, o STJ entende atualmente que a qualificadora não se comunica ao mandante do crime.

B) Com relação ao motivo torpe, a vingança pode ou não configurar a qualificadora, a depender da causa que a originou.

C) A ausência de motivo configura motivo fútil, apto a qualificar o crime de homicídio.

D) Para a configuração da qualificadora relativa ao emprego de veneno, é indiferente o fato de a vítima ingerir a substância à força ou sem saber que o está ingerindo.

E) A qualificadora relativa ao emprego de tortura foi tacitamente revogada pela lei específica que previu o crime de tortura com resultado morte.





Gabarito definitivo: Letra B.

Vamos aos comentários:

Letra A: Essa modalidade de homicídio é chamada pela doutrina como homicídio mercenário. Observa-se que existe a qualificadora é incisiva ao dizer que o pagamento pode ser realizado antes ou depois. E este pagamento pode ser somente em dinheiro? A resposta é negativa e para este caso entenda que deva ser qualquer vantagem de natureza patrimonial. Explorando o erro da questão, o STJ entende que tal qualificadora aplica-se ao mandante do crime como se vê no HC 99144-RJ, encontrado no informativo 375:

HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO MEDIANTE PAGA. EXCLUSÃO DE QUALIFICADORAS. INVIABILIDADE. PAGA OU PROMESSA DE RECOMPENSA. COMUNICABILIDADE. RECURSO QUE IMPOSSIBILITOU A DEFESA DA VÍTIMA. REVOLVIMENTO DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE.

1. No homicídio mercenário, a qualificadora da paga ou promessa de recompensa é elementar do tipo qualificado e se estende ao mandante e ao executor.

2. Para se excluir a qualificadora do recurso que impossibilitou a defesa da vítima é indispensável o revolvimento do material fático-probatório, o que é vedado na via do habeas corpus.

3. Ordem denegada.


Esse também é o posicionamento do STF que em 1995, em seu HC 71582-MG também reconhece a qualificadora como elementar do crime e por isso comunica-se ao seu mandante:

3. Homicidio qualificado: a comissão do homicidio mediante paga, sendo elementar do tipo qualificado, e circunstancia que não atinge exclusivamente o "accipiens", mas também o "solvens" ou qualquer outro co-autor: precedentes.


Pacífico entendimento de que as elementares objetivas do crime de homicidio - incisos III e IV - comunicam-se.


Letra B: Aqui registraremos o significado de TORPE, que segundo o dicionário Houaiss: 1. Que contraria ou fere os bons costumes, a decência, a moral; que revela caráter vil; ignóbil, indecoroso, infame 1.1. que contém ou revela obscenidade; indecente; 2. que causa repulsa; asqueroso, nojento; 3. que apresenta mácula; sujo.

Para não ficar com poucos comentários, uma pequena pesquisa poderá ser feita no site do STJ para ver o Tribunal não entende como motivo torpe. Registramos:

  • réu que matou a esposa por não aceitar separação. HC 77309-SP.

Letra C: A ausência de motivo, por si só, não é apto para qualificar o homicídio como fútil. Percebemos que no inciso II, do artigo 121 do CP não há possibilidade em realizar uma interpretação analógica. Já nos incisos I, II e IV, o legislador listou alguns exemplos e adicionou a expressão “ou outro...” oferecendo ao aplicador um norte interpretativo.

Há doutrinadores que não entendem desse modo. Consideram sempre haver uma razão que leve uma pessoa a tirar a vida de outra e com isso repudiar tal conduta, se não for fútil, será motivo torpe. Nesse sentido Damásio de Jesus:

O motivo fútil não se confunde com a ausência de motivo. Assim, se o sujeito pratica o fato sem razão alguma, não incide a qualificadora, nada impedindo que responda por outra, como é o caso do motivo torpe.

Para Rogério Greco e Fernando Capez o entendimento é oposto. Para esses renomados autores entendem que “matar alguém sem nenhum motivo é ainda pior que matar por mesquinharia, estando, portanto, incluído no conceito de fútil”.

Greco, em seus ensinamentos ainda trás novas explicações:

“...não podemos confundir é o fato de não sabermos o motivo e, sem mais, qualificar o homicídio, com o crime de morte sabidamente sem motivo, ou seja, matar por matar, que dificilmente ocorre. Pelo fato de não sabermos o motivo do homicídio não podemos reputá-lo como qualificado; ao contrário, aquele que mata alguém sem qualquer motivo, um minus, ainda, com relação ao homicídio fútil, deve merecer a qualificadora.”

Letra D: A qualificadora prevista no inciso III, do §2º, do artigo 121 utiliza-se da expressão insidioso, que segundo o dicionário Houaiss, quer dizer: que arma insídias; que prepara ciladas; enganador, traiçoeiro, pérfido. Não confundir com meio ardil, pois por esse meio requer um mínimo de astúcia e habilidade. De posse desses significados e lendo o CP, toma-se por necessário que a vítima não saiba que está ingerindo o veneno sob pena de haver uma mudança no tipo penal. CUIDADO: Caso a obrigação em tomar o veneno seja forçosa, e a vitima saiba que é veneno, poderá ser usada a qualificadora de meio cruel e não mais o de meio insidioso.

Letra E: Não foi revogado. No homicídio (artigo 121, §2º, III) temos o animus necandi. Ele não visa a tortura, apenas faz o uso da tortura para atingir o fim almejado, que é a morte de sua vítima. Já na Lei 9455/97, em seu art. 1º, §3º, tem-se que a intenção é a própria tortura e o resultado é imprevisível. Trata-se de uma hipótese de crime preterdoloso (dolo na tortura e culpa na morte).

Bons estudos!

3 comentários:

  1. Olá Renato como estás?
    Primeiramente gostaria de te parabenizar por este maravilhoso blog. Já o inclui em meus favoritos e já estou o divulgando para algumas pessoas confiaveis e sérias.

    Posteriormente, é notável a melhora na visualização do site. Está muito bom. Novamente, meus parabéns.

    Por fim, acredito que o homicídio "fundamentado" em uma ausência de motivos seria considerado banal e não fútil. " (...) Já que não se pode conhecer como um motivo fútil a simples falta de razão para o crime. " (RF 211/319)
    (Trecho tirado do artigo: http://www.fragoso.com.br/cgi-bin/heleno_artigos/arquivo21.pdf )


    Achei este artigo interessante e espero que lhe seja útil de alguma forma.

    Bons estudos.

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  2. Homicídio sem motivo cai na regra geral do art. 121, ou seja, não haverá qualificação.

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  3. A rigor, não existe homicídio sem motivo, pois, se tratando de conduta humana, sempre é motivado. Se o agente não pode prever o resultado, será culposo. se for caso fortuito ou involuntário ( ato reflexo, por exemplo ), exclui-se a punibilidade.
    O que pode acontecer é não ser possível descobrir e determinar o motivo. Então, não poderá ser presumida a qualificadora de motivo, por este ser desconhecido ( "in dubio pro reo" )

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